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Um exemplo, de como podemos errar em fazermos juízo prévio do caráter e personalidade de um desconhecido. Ajuda sob as águas.


AJUDA SOB AS ÁGUAS

Um relato real – Rio Mogi Guaçu, Guatapará – SP

A avidez em fazer bom uso do tempo, às vezes, nos faz deixar passar detalhes valiosos à nossa volta. Este, meu primeiro blog, é uma forma de partilhar experiências e pensamentos com pessoas de todos os cantos — ainda que sem o contato direto, sem o olhar frente a frente. Há, contudo, os que, como eu, buscam algo que vá ao encontro de seus anseios mais íntimos.

Escrever sempre foi um prazer. É por isso que me envolvo nesse universo de palavras. Na essência dos meus textos, carrego a honestidade de um simples desejo: ser lido. Mas não apenas isso — seria egoísmo da minha parte. Em tudo o que publico, quero deixar algo que inspire, que sirva de estímulo ou exemplo, algo que, de algum modo, possa fazer bem a quem lê.


Domingo ensolarado

Acredito ser justo iniciar minhas exposições com uma história real — um episódio que, felizmente, terminou bem e me mantém aqui para contá-lo.

O cenário era o rio Mogi Guaçu, sob a velha ponte de Guatapará, num domingo de sol forte. O céu estava limpo, as nuvens pequenas e brancas se espalhavam pelo horizonte, e a luz parecia abençoar a alegria das pessoas reunidas. Famílias, crianças, jovens e adultos — uns nadavam, outros apenas observavam da ponte.

Eu, cansado de tanto nadar pela manhã, tentava descansar na areia. O calor era intenso, e o reflexo da água fazia o sol parecer ainda mais vivo. De vez em quando, eu protegia os olhos com a mão, evitando a areia levantada pelas crianças que corriam por perto.

O rio, em época de chuva, chegava a cem metros de largura. Sua força e beleza sempre me fascinavam — seguia seu curso firme, desviando de pedras, rompendo distâncias, sem jamais se deter.

De repente, gritos cortaram a tranquilidade da tarde. Adultos e crianças corriam em desespero. Levantei-me, sem entender o que acontecia. O pilar da ponte me impedia de ver o que havia além, mas algo em mim despertou. Pressenti um afogamento.

Corri até a margem. Vi pessoas apontando para o meio do rio. Um rapaz se debatia, pedindo socorro, as palavras quase engolidas pela água. Segundo os amigos, ele não sabia nadar e havia bebido demais.

Havia ali bons nadadores, mas ninguém agia. O medo os paralisava — e a cada segundo o rapaz afundava um pouco mais. A canoa mais próxima hesitava em se aproximar; temiam que, em seu desespero, ele virasse o barco.

Eu observava tudo à distância, dividido entre o impulso de ajudar e a voz interna que dizia para não me envolver. Eu era um estranho na cidade, sem moradia fixa. Dormia em bancos de praça ou perto dos pesqueiros à beira do rio. Viera de um colégio de órfãos e sobrevivia como podia. As pessoas me olhavam com desconfiança, sem nunca me conhecer de verdade.

Mas ali, diante de um ser humano prestes a morrer, não havia espaço para hesitação. Mesmo sem treinamento, mergulhei.


O resgate

A correnteza era forte. O rapaz já perdia a consciência. Seu olhar estava distante. Nadei até ele e agarrei seu pulso direito com a minha mão esquerda. Ele tentou se apoiar em mim, mas isso nos levaria ao fundo. Gritei para que se acalmasse.

Por instinto, torci o braço dele para mantê-lo afastado do meu corpo, enquanto impulsionava com as pernas para mantê-lo à tona. Ele pesava como se o corpo já tivesse desistido. A correnteza nos arrastava rio abaixo, mas eu sabia que lutar contra ela seria inútil. Deixei que nos levasse, tentando apenas mantê-lo vivo.

Ouvi gritos da ponte e da margem. As pessoas acompanhavam aflitas, impotentes.
Uma canoa se aproximou — alguém tentou me alcançar com uma vara de pesca. No impulso, agarrei-a, e nesse instante fomos puxados para baixo. A água escureceu. O brilho do sol sumiu.

Debaixo d’água, pensei: Se ele ficar, eu também fico.
Reuni o resto das forças e nadei para cima. Os pulmões queimavam, mas continuei. Senti o peito arder como se houvesse brasas dentro. Quando a luz começou a surgir sobre nós, percebi que ainda havia tempo. Emergimos, ofegantes.

A correnteza nos havia levado um bom trecho. Meus pés tocaram o fundo pedregoso — a margem estava próxima. Segurei a borda da canoa, e puxaram o rapaz. Depois, me ajudaram a subir.

Ele, ainda atordoado, recusou ajuda, levantou-se e correu cambaleando com a água na altura dos joelhos. Fiquei parado, sem dizer nada. As pessoas se aglomeravam ao redor. Eu apenas me afastei, em silêncio, seguindo na direção oposta.

Pouco tempo depois, deixei Guatapará.
Sem documentos, com dezessete anos e uma paixão juvenil deixada para trás, parti para São Paulo.

E a vida continuou...


Epílogo

Aquele dia marcou mais do que um simples salvamento. Foi a primeira vez que senti, de forma plena, o valor da vida — e a certeza de que, mesmo invisível aos olhos de muitos, eu podia fazer diferença.

Red9 : O Visionário que semeia o Amanhã   Filósofo urbano, arquiteto de ideias audaciosas, Red9 não sonha pequeno. Ele confronta as raízes d...